quarta-feira, 30 de novembro de 2011

sound of silence

há corpos, traços plásticos de corpos.
eles circulam feito predadores de mercado que buscam sua presa.
aquela presa. preso em sua infinita insegurança e um palco que é montado para disfarçá-la.
preso preso e preso fora. dentro, livre.
e os corpos plásticos? livres? mercadoria. corpo-mercadoria.
empacotados com cartão de visita.
script. cenário. cheiros programados.
corpos atrás de vidas. vendem a vida pra viver.
sem sorrisos e lágrimas. só plástico.
e a presa? jardim. projeção de jardim pra sentir-se forte.
um jogo de enganos e auto-enganos. do predador à presa.
quem se beneficia? produtor. produtor de não-lugares.
corpos, presa, produtor. quem é feliz?

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

o primeiro sono

enquanto dedos escorrem em corpo, corpo ergue-se acima dos chãos.
são entre aqueles milímetros de tempo em que o peso atinge as pálpebras que sinuosamente dá formas a mais extensa fantasia.
um menino metade corpo metade música convida-os ao baile.
flutuando através do cheiro de saudades rosas eles se encontram, depois de décadas, séculos! milênios!
o encanto do encontro deu a entender que nada mais o separariam
dá-se o chamado do globo ocular a retornar à posição genérica, porém as pálpebras cerradas ainda se recusam.
retorno ao disfarce "real". àquele que rondamos mortos.
mas ainda resta um jeito: entregar-se aos prazeres do sonho, e flutuar novamente.

terça-feira, 4 de outubro de 2011

uma carta de Somewhere Land

estou em estado de desespero. esta é uma carta de despedida. a quem escrevo? não sei. na verdade sei. à Ninguem. ou quem sabe a mim mesmo. mas quem sou Eu? me vejo eternamente me despedaçando em infinitos projéteis como um estilhaço de uma bomba localizada nos meus órgãos vitais que é acionada num simples sopro dos ventos provindos de um buraco negro. e ao mesmo tempo me reconstituindo como retalhos costurados à linha e afiada agulha. o problema é que estes retalhos são recosturados na mais pura desordem. contrastando com o mais perfeito dos quebra-cabeças finalizados.
o fim é o que eu busco, um ponto final. o último encontro. o encontro com a Morte. talvez seja pra ela a quem remeto esta primeira e última carta. sei que ao assinar a última letra eu sumirei, assim espero. cansei do infinito, quero poder desenvolver uma memória, assim poderei cuspir este fardo pesado que chamo de vida e deixá-lo lá atirado para me desfazer de uma responsabilidade.
Morte, por favor, entrego-me a ti e somente a ti. aceite meu último suspiro de existência.

Somewhere land

existe um lugar cujos habitantes se comunicam apenas por trocas de energias, sensações e gestos.
muito se tentou documentar algo de lá. sem sucesso. no momento em que Algo era definido, Algo desaparecia. ninguem entendia o porquê, simplesmente sumia, se desintegrava. esta tentativa foi deixada de lado.
neste lugar o conceito de espaço era incoerente pois enquanto os seres se comunicavam, desta troca surgia-se Algo novo, como se estivesse em contínua expansão. da mesma lógica do sumiço, existia o surgimento.
neste lugar o conceito de tempo era incoerente pois a cada troca de energia mais vivo, tudo que havia lá, ficava. tudo era imortal, não havia fim.
o sentido da vida lá era a vida e a vida só potencializava-se no contato, no encontro entre seus habitantes, e assim viviam eles, estes: sofrendo. com o sofrimento, o lugar se expandia, os habitantes vitalizavam-se e cada momento era novo e diferente.
este lugar nunca poderá ser encontrado, descoberto e definido. apenas sentido.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

desconforte-se

Doces momentos em que Pedro salta para fora de sua casa. Retira-se de seu fétido lar
coberto de energia densa que o amarra em sua prisão voluntária.

Pedro dedicou-se massivamente na construção de seu espaço-depósito de isolamento
e solidão. Tem medo dos mistérios do Fora. Da imensidão do mundo. Da possiblidade dos
encontros de olhares com os desconhecidos da rua. Tem medo de perceber que é pequeno e
covarde. Por isso se tranca. Com seus cigarros e suas dores.

O medo se transforma em preguiça, ou preguiça sempre foi, nunca se soube. Não
importa. Pedro fica em casa e se esvazia. Vomita o mundo, caga as lembranças. Excreta tudo:
planos, desejos, possibilidades. A materialidade se dissolve, porem seu odor permanece. Odor
denso. Pedro vazio, atmosfera densa. O ar esmaga Pedro.

Procura desesperadamente um jeito de fazer o tempo passar mais rápido. Fuma
seus cigarros devagar até que sua garganta seque. Se masturba sem vontade, sem nenhuma
referência. Abre o jornal nos horários das sessões de cinema já sabendo que não irá. Senta no
sofá e espera um convite anônimo.

De repente, quando o ambiente de clausura já se tornava insustentável ao corpo de
Pedro, uma carta surge por debaixo de sua porta. Um convite para uma defesa de doutorado.
Sem pensar, Pedro veste seus calçados e sai.

A luz do fim do dia desconforta seus olhos, o que a Pedro lhe agradou, pois o
desconforto o distanciava de sua ausência de dor. Pedro nunca se sentira tão feliz perante
aquela sensação que o lembrava de sua existência.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Amor [3]

suave coisa nenhuma, seco ou molhado...

domingo, 4 de setembro de 2011

desremendo

A vida é aquele pequeno orifício em que deixamos escapar um bocado de loucura.

Amor [2]

um pingo gelado de um líquido cristalino que pousa na pele quente e logo depois a perfura entrando em contato com o nervo mais sensível do corpo.
no primeiro momento, arrepio e prazer
no segundo, dor e angústia.
Este pingo é uma lágrima de mercúrio. Essa lágrima é o amor.

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Amor [3]

Tremores, dores, febres, insônias.
Doutor, estaria eu doente ou apaixonado?

Não se vê por aqui.

Essa sociedade era repentinamente particular.
Havia divisão de trabalho sim. Seus individuos, porém, incompreensivelmente, possuiam uma espécie de instinto distinto. Era como se sua função no mundo viesse através de seus próprios desejos. Como explicar isso?
Não sei. Desejos. Nada relacionados à necessidades de alimentação, reprodução. Me parecia que possuiam uma certa magia de livre arbítrio. Sem determinismos. Imagina! Como obter tais capacidades?
Direcionar ações aquém da sobrevivência como se houvessem outra opção. Seres insanos estes!
Caos, confusão, loucura!
Coitados, não gostaria de estar na pele deles!

E então, a abelha operária subitamente acorda do transe e, com enxaqueca, volta ao trabalho na colméia.

sábado, 3 de setembro de 2011

Memória

Uma das maiores cobranças humanas, entretanto mais dolorosa.
E nessa disputa quem ganha é o esquecimento.
Árdua batalha entre o passado e o presente.
E quem ganha? O presente.
E assim entramos no Eterno Retorno de Nietzsche.
Repetimos como se nada aprendessemos.
Não aprendemos com a História, aprendemos com o Erro. Afinal, quem não quer errar? Quem não quer experenciar o erro?
Não me venha com a história de se precaver. No ápice de nossas ações, o que menos prevalece é o passado. Viramos criança botando o dedo na tomada.
Memória, tu precisa de mais força. Sem ela, loucos seríamos. Inconsequentes corpos jogados no mundo esperando uma punhalada no rosto. E, ao vermos nosso próprio sangue escorrendo, aí sim pensamos na morte.
Ó, mas precisamos do sangue! Precisamos!

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Amor

É interessante observar o esforço do ser humano em definir o indefinível. De tornar visível o invisível. De objetivar um sentimento.
Não condeno isso. A dúvida é insustentável. A incerteza nos dá insegurança. O abstrato nos angustia. Porém, existem infinitas maneiras de definir algo.
Uma delas é instituí-lo racionalmente como verdade ao mesmo tempo condenando outras possibilidades como mentiras.
Não existe maneira mais fácil - portanto confortante - do que criar sistemas binários. Mentira OU verdade, certo OU errado, isso OU não-isso. Neste processo acabamos por reduzir o universo. Ficamos com o hábito, descartamos o "não-hábito"; ficamos com a realidade e descartamos a fantasia; ficamos com o mundo e descartamos o não-mundo?!
Quando trato de sentimentos, amor, prefiro usar um termo diferente. Não defino ele, e sim dou sentido. Sentido porque é algo que se sente. É algo que se manifesta através de sensibilidade. Através de olhares, cheiros, sabores, sons, toques. Percebam que citei nossos cinco sentidos. Elementos, ou melhor, alimentos da vida. Prazer. Não da vida que se opõe a morte. Não do prazer que se opõe ao desprazer ou do amor que se opõe ao ódio. Repito: sem sistemas binários. Eles reduzem. O sentimento sobretudo é potencializante. Ele sim, torna visível o invisível. E o principal, ele só se difunde, materializa-se no contato entre corpos.
Aí vem a questão: como se difunde amor sem contato direto entre corpos? Como compartilhamos simbolicamente algo que é tão abstrato e tão individual?
Por mais que a Palavra não esteja entre os cinco sentidos, ela é uma excelente ferramenta para dar sentido à sentimentos. Palavra não somente escrita, como qualquer meio de comunicação que o ser-humano desenvolveu.
Não simplesmente escrever Amor em uma folha de papel fará alguém amar. Mas sim, palavra acompanhada de performance. A palavra acompanhada da não-palavra.
Uma carta de amor, uma imagem propositiva, um romance, uma melodia, uma lágrima. Um quê de improvável, de surpresa, de imprevisível, e por que não de loucura?
Trazer a tona um desconhecido para fazer parte, dar bom dia, ao nosso pequeno mundo. Sua recepção não será apenas racional. A desrazão tambem será convidada, através da sensibilidade.

Este texto não tem como funçao transmitir um conteúdo, uma informação. É apenas uma expressão potencializadora de qualquer sentido. Como uma poesia. Como um sonho...
Amo vocês. Muito obrigado

Desconferências, 31 de agosto de 2011.

livros

Existem livros que possuo e não os abro mão de sua matéria.
Existem livros que possuo porém já estão projetados dentro de mim.
Existem livros que não possuo e gostaria de tê-los em minha estante.
Existem livros que não existem, não estão em minhas estantes, não tenho cobiça em tê-los. São estes que desejo materializa-los, torna-los reais a partir do irreal. E passá-los adiante.

domingo, 21 de agosto de 2011

perfeição

é de se pensar quando percebemos que quanto mais longe o sol e a lua estão de nós, mais perfeitas são suas circunferências.

domingo, 31 de julho de 2011

atentado vital

cores sons e sabores
ingredientes da vida
tato cheiro e tremores
uma extensa avenida
um sorriso preso
dores, dores e mais dores

dores na alma, um arrepio
dilacerando víceras
e produzindo suspiros
como um flecha cravada no peito
e pó de magia flutuante, flamejante
que por mais que a dor errante
percorra em nossas veias
nos caem como gozo, nos conduzem a sentidos

sentido sensibilidade sensação
isso é vida irmão. isso é vida.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

12 segundos de oscuridad


Gira el haz de luz
para que se vea desde alta mar.
Yo buscaba el rumbo de regreso
sin quererlo encontrar.

Pie detrás de pie
iba tras el pulso de claridad
la noche cerrada, apenas se abría,
se volvía a cerrar.

Un faro quieto nada sería
guía, mientras no deje de girar
no es la luz lo que importa en verdad
son los 12 segundos de oscuridad.

Para que se vea desde alta mar...
De poco le sirve al navegante
que no sepa esperar.

Pie detrás de pie
no hay otra manera de caminar
la noche del Cabo
revelada en un inmenso radar.

Un faro para, sólo de día,
guía, mientras no deje de girar
no es la luz lo que importa en verdad
son los 12 segundos de oscuridad.

Escravos da Posse

dificil acreditar que os bens mais preciosos do ser humano são aqueles que caem líquidos e invisíveis em suas mãos.
a armadilha surge de não perceber que a riqueza do mundo não precisa vir contida de etiquetas com nossos nomes. que não precisamos nos agarrar em objetos táteis para dormirmos sem nos sentirmos sós.
ao compartilhar relações vivas com o mundo, o vazio de nossos sacos de presentes se preenchem.
ao catalizar nossas trocas nervosas com o universo, nos tornamos seu protagonista. e essa posse não carece de acordos, documentos, propriedades. sua garantia não é material. é Vida. é um novo Sonho. uma nova Lágrima. um novo Sorriso. e, principalmente, um novo Sentido.

Cabo Polônio - julho de 2011

terça-feira, 31 de maio de 2011

a estética do acaso

difícil de convencionar
mais ainda de descrever
linguagem dominante alguma conseguiu expressar
a estética do acaso

ela desliza no meu braço como se não existissem moléculas que se compatibilizassem
como se estivesse do outro lado do lado
transcendente é
a estética do acaso

me escapa como um inseto
de dominador, passo a ser dominado
nos faz ínfimos, decadentes, impotentes, desumanizados
a estética do acaso

passivos de verbos passivos, frágeis, e por que não cegos?!
pois o que nao conseguimos enxergar é que,
apesar de que o outro lado estará sempre do outro lado, nao percebemos o que está do nosso lado de fato:
a estética do acaso

sábado, 21 de maio de 2011

"muda que o medo é um modo de fazer censura".


documentário excelente, explicativo, de acesso tranquilo e, o principal para os crédulos contemporaneos: de cunho científico. precisamos mudar nossos direcionamentos e apostar no senso crítico. veja de cabeça aberta o que ele tem a nos oferecer, não é dificil perceber o mundo a nossa volta. basta nos desviarmos um pouco da produção midiática dominante, buscar outras fontes. Não querendo diminuir esta produção, mas lembro que isso não é um texto celestial, uma bíblia: é um trabalho, documentário, produto humano. mostra que sim, podemos nos manifestar, sermos protagonistas da nossa história. e mais, esse documentário não serve apenas aos "caretas". é um excelente instrumento crítico a quem defende uma causa cega sem fundamentos, mesmo que contra a maré da sociedade: o revolucionario tambem precisa de referência, precisa de conteudo crítico, porque se não, mesmo pensando que estão mais próximos de uma mudança, só reforçam esse mesmo sistema retrógrado. E para aqueles que assumem uma posição conservadora e pró-sistemica que pelo menos se atentem nessa declaração: eu não sou usuário de maconha.


sexta-feira, 20 de maio de 2011

a realidade rasga;

sonho com o dia em que não restará nada além do amor
sonho com o dia em que em seus olhos reflita mudanças, em que seus olhos reflita cores celestiais
sonho com o dia em que seu brilho seja uma memória que me faça doer e ao mesmo tempo gozar
sonho com o dia em que me esqueça da figura amarga perturbante e que me reste uma figura doce e perturbante
sonho com o dia em que te veja em um retrato estático cheio de energia, que não te veja em movimento repuxando meus órgãos todos os dias que acordo
sonho. sonho porque o que sonho é sonho.

domingo, 1 de maio de 2011

marcha ré

a necessidade de inovação é um fenômeno tão conservador quanto seu antônimo.

domingo, 24 de abril de 2011

o vazio sou eu

arranquei minha própria alma e arremessei pro infinito, deixando um corpo exposto de nervos distorcidos.
onde fica a dor? nesta alma sedada ou nesse corpo pulsante?
onde se produz a lágrima? no signo ou na substância?

e o vazio? ele se localiza, se institui ou é um produto inexistente de processo?

manifestação sem origem. proposição sem catarse. vacuo energizado.
o vazio sou eu.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

24 horas e dois universos.

Cansado de sustentar uma rotina noturna, Xénos decidiu que hoje tomaria coragem de pedir demissão no emprego. Morava com sua avó, contudo nunca haviam se cruzado em casa, afinal sempre que voltava depois do amanhecer a velha já estava na padaria e, quando acordava a mesma já se encontrava num sono pesado em sua cama localizada no fundo de um quarto no fundo de um apartamento no fundo de um corredor de prédio. Não é preciso dizer que Xénos nunca pisava naquele lugar melancólico que mais parecia uma caverna umida e mofada do que qualquer outra coisa a que chamemos quarto.
Xénos acorda, como sempre, sem despertador. Caminha até a cozinha, onde procura o resto de café coado que, de forma sempre previsível, nunca sobra. Abandonando o bule de alumínio deformado pelo tempo, se contenta que não há mais nada o que fazer naquele lugar. Pega a chave e começa o ritual de abrir as cinco trancas da porta de entrada. Sim, Xénos é inseguro. Antes de sair, nunca esquece de levar sua faca de serra, o instrumento mais defensivo que tem. Ele sabe que ao sair de casa vai enfrentar a rua, palco do mistério, onde as coisas são fruto do acaso. Xénos sabe que mudará de um universo previsível que é seu apartamento para um universo que a cada pisada no chão um novo fenômeno se apresenta. O caso é que, de tão acostumado com essa infame jornada, o imprevisível para ele já era rotina. Mas hoje não.
Hoje Xénos vai cortar o laço da previsibilidade do imprevisivel. Vai pedir demissão.
Sai na rua, de cabelos engruvinhados, barba por fazer, mesma roupa de ontem (quiça de anteontem), mas ninguem nota. Sente a sensação rotinesca de que é o mais sóbrio daqueles que perambulam pelo caminho. Mais que o senhor de 60 anos que anda com seu carro na contramão e o travesti que o acompanha no banco ao lado. Mais que o mendigo que caminha em passos tortos e sua companhia na qual só ele consegue ver e conversar. Mais até que o guarda-noturno e o traficante que fazem negócio na esquina escura. Será que Xénos está certo? Será ele o mais sóbrio da rua ou ao contrário? Uma coisa é certa. Ele é o mais solitário da rua.
A todo caminho Xénos pensa em como será sua vida amanhã. A única coisa que sabe é que enquanto a noite é governada pela (e apenas) a lua, o dia é governado pelo homem. E àqueles que buscam a liberdade de suas pulsões e desejos oprimidos pelos olhos invisíveis diurnos, migram para o regime lunar, no qual inexiste qualquer contrato social e existe um consentimento da memória passageira, onde as coisas acontecem e depois são esquecidas, como um sonho.
Xénos fará o contra-caminho. Vai migrar para o universo da lei e, assim, conseguirá tirar três das trancas de sua porta, se sentar no sofá no conforto do lar e ver televisão, sem antes programar o despertador para o novo dia.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

quando o êxodo vem antes da gênese

fruto do sacro-profano, da narcisogenitura que me gospe forçosamente do meu exílio de liberdade.
sim, Liberdade. liberdade de desconhece-la. aliás, de inexisti-la.
exílio de minha fase seminologica, completa, cruamente viva que vive e só.
só. somente Só. individuo apenas, nem isso. Ser. ser que é e não é, que não precisa.
broto que, se não pomposo, não serviria pra nada. se não carregado do nome de quem me carrega, nada sou. agora Sou.
tenho nome. gênito. a quem de primeira visita se faz esquecer o genitor. pouco importa. roubo a cena. a cena do infortúnio.
me traficam. sequestram-me de meu exílio. podres alvas mãos que dizem salvar, desamparam.
o espetáculo começa. o Nada vira Gente. o Gente, enquanto primeiro estigma de adaptação, após por pra dentro das narinas o gas putrefante do mundano, cai em prantos e lamentos.
chora e há de chorar para sempre.

quinta-feira, 31 de março de 2011

( )

o teu me atormenta
o teu me faz tornar indiferente, mediocre
o teu me ganha, me atinge, me põe de quatro
o teu laça meu amor, meu ódio
o teu é dilacerante, me parte em dois
o teu misterioriza tua imagem
o teu esconde teu olhar
o teu esconde a tua fraqueza
o teu me dá poder
o teu só machuca e esconde

o teu silencio é o teu discurso para minha morte.
o meu ruido é minha ressureição

quarta-feira, 30 de março de 2011

lombar

matei uma lagartixa.
não jantei.
acordei com medo da minha cama, logo, com medo de mim.
meu chuveiro e minha pia combinaram de se engraçar.
fumei apenas dois cigarros hoje.
mais uma vez sofri por amor.
deixei de sofrer porque deixei de querer, e de não querer, portanto sofri, portanto quis.
tive medo do amanha.
estou com medo de dormir.
ainda tenho cama.
não tenho mais lagartixa.
não tenho fome.
tenho xarope pra tosse.
na verdade fumei três cigarros hoje.
amanhã meu chuveiro e minha pia vão acordar de luto...

sexta-feira, 18 de março de 2011

Vá pra VIDA que os pariu!

Universo paralelo, transcendência, sobrenatural. Tivemos que criar termos para exprimir a angústia do desconhecido. E, inconsientemente, depositamos todos esses (in)significados da vida, regurgitados, em recipientes linguísticos vazios os quais, por um processo de reificação, enterramos a sete pés.
Tivemos que cortar o cordão umbilical, através de um instrumento chamado medo, que nos liga a nossa alma. Alma esta que, paradoxalmente, não pesa e pesa, invisível e negra, de seda e espinhosa. Alma esta é o amor.
Para anestesiarmo-nos tivemos que criar o conceito de amor sem ódio, de felicidade sem tristeza, de sentir sem sentir. Com esses novos conceitos, cercamo-nos em fortalezas morais. E, com o que repugnamos experimentar, escondemos no campo da fé.
Oh, mas por que sofremos tanto mesmo assim? Não nos basta viver em paz?
Sofremos porque sentimos, sentimos porque vivemos e vivemos porque amamos.
Deixemos que a dor nos ataque, que o sofrimento nos perfure, que a sensibilidade nos convença, que o medo não nos ganhe e que o amor nos tome conta. Assim, "almados", viveremos o mundo cru(el), desnudo e atemporal.