domingo, 24 de abril de 2011

o vazio sou eu

arranquei minha própria alma e arremessei pro infinito, deixando um corpo exposto de nervos distorcidos.
onde fica a dor? nesta alma sedada ou nesse corpo pulsante?
onde se produz a lágrima? no signo ou na substância?

e o vazio? ele se localiza, se institui ou é um produto inexistente de processo?

manifestação sem origem. proposição sem catarse. vacuo energizado.
o vazio sou eu.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

24 horas e dois universos.

Cansado de sustentar uma rotina noturna, Xénos decidiu que hoje tomaria coragem de pedir demissão no emprego. Morava com sua avó, contudo nunca haviam se cruzado em casa, afinal sempre que voltava depois do amanhecer a velha já estava na padaria e, quando acordava a mesma já se encontrava num sono pesado em sua cama localizada no fundo de um quarto no fundo de um apartamento no fundo de um corredor de prédio. Não é preciso dizer que Xénos nunca pisava naquele lugar melancólico que mais parecia uma caverna umida e mofada do que qualquer outra coisa a que chamemos quarto.
Xénos acorda, como sempre, sem despertador. Caminha até a cozinha, onde procura o resto de café coado que, de forma sempre previsível, nunca sobra. Abandonando o bule de alumínio deformado pelo tempo, se contenta que não há mais nada o que fazer naquele lugar. Pega a chave e começa o ritual de abrir as cinco trancas da porta de entrada. Sim, Xénos é inseguro. Antes de sair, nunca esquece de levar sua faca de serra, o instrumento mais defensivo que tem. Ele sabe que ao sair de casa vai enfrentar a rua, palco do mistério, onde as coisas são fruto do acaso. Xénos sabe que mudará de um universo previsível que é seu apartamento para um universo que a cada pisada no chão um novo fenômeno se apresenta. O caso é que, de tão acostumado com essa infame jornada, o imprevisível para ele já era rotina. Mas hoje não.
Hoje Xénos vai cortar o laço da previsibilidade do imprevisivel. Vai pedir demissão.
Sai na rua, de cabelos engruvinhados, barba por fazer, mesma roupa de ontem (quiça de anteontem), mas ninguem nota. Sente a sensação rotinesca de que é o mais sóbrio daqueles que perambulam pelo caminho. Mais que o senhor de 60 anos que anda com seu carro na contramão e o travesti que o acompanha no banco ao lado. Mais que o mendigo que caminha em passos tortos e sua companhia na qual só ele consegue ver e conversar. Mais até que o guarda-noturno e o traficante que fazem negócio na esquina escura. Será que Xénos está certo? Será ele o mais sóbrio da rua ou ao contrário? Uma coisa é certa. Ele é o mais solitário da rua.
A todo caminho Xénos pensa em como será sua vida amanhã. A única coisa que sabe é que enquanto a noite é governada pela (e apenas) a lua, o dia é governado pelo homem. E àqueles que buscam a liberdade de suas pulsões e desejos oprimidos pelos olhos invisíveis diurnos, migram para o regime lunar, no qual inexiste qualquer contrato social e existe um consentimento da memória passageira, onde as coisas acontecem e depois são esquecidas, como um sonho.
Xénos fará o contra-caminho. Vai migrar para o universo da lei e, assim, conseguirá tirar três das trancas de sua porta, se sentar no sofá no conforto do lar e ver televisão, sem antes programar o despertador para o novo dia.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

quando o êxodo vem antes da gênese

fruto do sacro-profano, da narcisogenitura que me gospe forçosamente do meu exílio de liberdade.
sim, Liberdade. liberdade de desconhece-la. aliás, de inexisti-la.
exílio de minha fase seminologica, completa, cruamente viva que vive e só.
só. somente Só. individuo apenas, nem isso. Ser. ser que é e não é, que não precisa.
broto que, se não pomposo, não serviria pra nada. se não carregado do nome de quem me carrega, nada sou. agora Sou.
tenho nome. gênito. a quem de primeira visita se faz esquecer o genitor. pouco importa. roubo a cena. a cena do infortúnio.
me traficam. sequestram-me de meu exílio. podres alvas mãos que dizem salvar, desamparam.
o espetáculo começa. o Nada vira Gente. o Gente, enquanto primeiro estigma de adaptação, após por pra dentro das narinas o gas putrefante do mundano, cai em prantos e lamentos.
chora e há de chorar para sempre.