terça-feira, 27 de março de 2012

Meu caro amigo P.

Meu caro amigo P.

Aqui na terra tão jogando futebol, tem muito samba muito choro e rock'n roll, uns dias chove (todos) outros dias bate sol. Mas o que eu quero é lhe dizer que esse asfalto cinza, esses prédios cinzas e esse céu cinza possuem almas coloridas. Que, mesmo adaptados com os lindos gramados campos de lá,. consigo absorver entre pedras, concreto e cimento alguns arbustos escondidos cheio de frutos saborosos. Resistência essa só é possivel pela energia provinda dos choques de humanóides de tão distintas culturas e corações. Gente fina, de terno com cravos no rosto; ambulantes, retirantes, zumbis; revoltados, confortados, apressados; asiáticos, indianos, globalizados; com olheiras, cegos, com fome; pedintes, contemplativos, oraores; malabaristas, pés de galinha, desiludidos; com adornos, suados, quase nus; gente que sonha, que tem esperança e que nem o sabem.
Uma cidade que não dorme. Bombardeio de informação, sensação, e inspiração. Cidade que inspira e transpira. Cidade que te invade, te deixa confuso, mexe em tuas entranhas e de lá não sai. P., aqui não existe gente sã. Intervenções performáticas a todo momento. Acho que era isso que eu procurava. Algo que me sacudisse, um motivo pra desacreditar que o mundo é finito e me sentar e chorar por isso. Chorar e oferendar minhas lágrimas à dialética do ponto e do plano. Da infimidade e da infinitude. do ser nada do ser tudo. Doce cidade amarga onde mendigos te ensinam Fernando Pessoa enquanto classe média-alta leva atraque da polícia.
Nunca havia me sentido tão pequeno, tão barro, tão somente só. Um andarilho perdido em um deserto insoluvel. De um lado a morte, do outro a solidão. Estou flertando com elas como o pássaro e suas grandes asas. Estou pulando de arranha em arranha céus quase pronto (e nunca ao mesmo tempo) para alçar vôo de olhos fechados. Mas sempre há um prédio mais alto para me chocar em suas medianeiras. Foda-se. Que me choque, que me esborrache, que sangre. Coma nenhuma é pior que o conforto nada. Coma nenhuma é pior do que ser conduzido à direção dos derrotados, dos sonhos desamparados. Cada pingo de tinta caindo no papel me dá mais forças de seguir buscando meu arco-íris.
Saudade de ti meu irmão, de nossas encruzilhadas, de nossos goles de vida. Um dia nos chocaremos nesse vasto universo e celebraremos uma festa. E continuemos acreditando em nossa amizade estelar, mesmo que nos tornemos inimigos na Terra.
Forte abraço, com amor.
Isoppo 02.03.2012

reflexões escorridas

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estou passando por uma fase de muitas quebras de paradigmas, muitas desconstruções sobre o mundo e as suas relações. prefiro expressa-las em literatura, poesia, não sou muito teórico metodologico epistemico nas minhas ideias, mas vou tentar. primeiro de tudo, nunca levem isso como auto-ajuda, cada um tem o seu jeito de seguir a vida e a sua verdade.
as duas coisas mais temerosas do homem são a morte e a solidão. temos muito medo de morrer e muito medo de ficarmos sozinhos. tanto, mas tanto medo, que tapamos os olhos e tentamos exprimir em vão da nossa consciencia essa dura realidade que nos permeia. a de que vamos morrer e a de que estamos sós no mundo. não estou dizendo que não exista amor, solidariedade, altruismo. existe. e não quero dramatizar nada. só compreendi que no fundo, nosso impulso vital é garantir-nos vida, e o impulso vital do outro é garantir-lhe vida. como diz alvaro de campos: "És importante para ti, porque é a ti que te sentes.

És tudo para ti, porque para ti és o universo,

E o próprio universo e os outros

Satélites da tua subjetividade objetiva.

És importante para ti porque só tu és importante para ti.

E se és assim, ó mito, não serão os outros assim?"

Somos sozinhos, vamos morrer, mas não conseguimos acreditar nisso. Eu resolvi tentar encarar esse fato, um dos grandes desafios de minha jornada, andar de mãos dadas com a morte e com a solidão. Não, isso não é uma metáfora pra me trancar num quarto e deixar de comer. É simplesmente aceitar a presença delas. Nessa atitude, vi que possuia a liberdade de sonhar e correr atrás de meus sonhos, sem o suficiente medo que me impedisse. Não digo que é um caminho confortante, sem dores, sofrimentos e responsabilidades. Talvez seja o mais sofrido. Mas por incrivel que pareça, nunca me senti tão vivo e tão compartilhando com o mundo. Refleti que a maneira mais eficaz de se sentir vivo e coletivo é aceitando a morte e a solidão.

São nessas experiencias-limite tambem que me sinto mais sensivel e mais inspirado para fazer o que eu mais amo, escrever. São nesses momentos que vejo o mundo muito maior com muito mais cor, mais amor, mais caminhos, mais permissível, mais sentidos. Se assumimos a solidão, alem de autonomia, temos mais responsabilidades afetivas com nós mesmos e com o mundo. e, com a arte - nao só como ferramenta como tambem espiritualmente - posso compartilhar e proporcionar trocas com o outro que transcendem a morte do corpo. Essa para mim é a verdadeira eternidade, o verdadeiro legado. não é sobreviver até os 120, mas eternizar, transcender em mensagens enérgicas e inspirantes. Platão continua sendo ressucitado por suas mensagens ha 2350 anos e continua vivissimo em nossas prateleiras, só citando um exemplo.

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terça-feira, 20 de março de 2012

passos cordiais / pontos cardiais

a luz só reflete pequenos raios que impossibilitam que veja alem de meus humildes pés. é como se o horizonte escuro me circunscrevesse em poucos metros e só perceba inícios de labirintos elípticos cujas ramificações são inúmeras.
necessito Andar. ando e o que fica pra trás torna-se translúcido. sinto medo e volto ao ponto de partida. são infinitos os calçados em infinitas tez para percorrer chãos de infinitas texturas que me levem infinitos destinos.
então me ponho a Voar. no entanto, são infinitos músculos que me permitem contrair minhas infinitas asas de infinitas penas a sofrer infinitas intensidades de vento e densidades de ar.
então me ponho a Mergulhar. novamente me deparo com infinitos volumes e pressões, infinitas marés.
parado não posso quedar-me. decidi, pois, me deixar levar pelas batidas do coração. e não é que consegui decifrar os pontos Cardiais?!

segunda-feira, 19 de março de 2012

febre

passo o traço no corpo ardente
braço e rosto onde tudo ferve
pele pálida mente ausente
viaja léguas ao sol poente
figura pura delírio rege
mundo outro natura bege
sistema nenhum alcança e foge
risco ferro declama morte
suplica suspiros de alma alheia
saco soco cerra soja
vasto cosmo estrela explode
zunido ecoa atrito choque
chora chora chora chega
espinho carne me serve chá
n'aguento mais dura enxaqueca
antes que adormeça abrace-me
abrace-me já.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Entre

Árvores pulsam vida independente dos ventos. independente dos tempos
árvores pulsam vida à quem sente sua vida nelas
à quem percebe sua vida fora do corpo
no entre-corpos

a matéria existe como ferramenta apenas ao fluxo de vida que circula e permite sua existência
as moléculas se atraem e repelem diante essa força e energia que se propaga entre seus corpos
e assim somos nós entre nós e outras matérias

neste momento sinto a vida da árvore pois ao olhá-la, sentí-la, me sinto vivo.
e o gramado que pouso
e a água da fonte que escuto
e se uma folha seca desta mesma árvore se destaca e pousa sobre mim, morta ela não está
e se carrego um cadáver, morto ele não se encontra

morto - apenas - estão aquilo que não optei viver
aquilo que optei não viver
aquilo que deixei de.
neste caso sou-estou morto
morto nos lugares que não fui
nas matérias que não senti
naquilo que não produzi memória alguma

agora, nesse instante, posso ser aquela árvore, o gramado e a fonte
inclusive a folha seca
inclusive o inseto que me mordeu, pois dei vida a ele

do que me serve pensar, cavocar, naquilo que deixei pra trás e não vivi?
nesse instante, apenas neste, posso ser, viver, dar vida à tudo que agora me permeia
já não é o bastante?

continuo ouvindo a fonte e, mesmo quando partir, mesmo quando não puder mais ouví-la
a fonte continuará viva
pela minha lembrança do seu ruido
lá sei eu da fonte de outro lugar! não importa.
agora sou fonte e pra sempre serei,
fonte desse lugar
e minha vida sempre estará entre meu corpo e ela

entre meu corpo e a árvore que pulsa.

quarta-feira, 7 de março de 2012

brotando astros

queria deixar registrado a alegria de presenciar uma bicicletada na avenida paulista. mais de 2 mil pessoas trancando a maior avenida da capital urbana. deitado no meio da rua até consegui observar algumas estrelas no céu cinzento. somos (ciclistas) essas estrelas que resistem às escuras nuvens poluentes. um dia o céu vai abrir mais e mostrar seu esplendor estrelado, os sorrisos e os ventos serão mais sinceros e a humanidade finalmente revelará que deus não precisa existir em outros planos, muito menos ser chamado de deus.