terça-feira, 17 de julho de 2012

Gozo venenoso

Decidiram, enfim, viver daquilo que moviam seus arrepios. Não careceram estabelecer contratos, conceitos, palavras que os definissem. Era ponta de lança, alimentação imediata de desejos, entrega dos corpos quando assim pedissem. Paixões movidas pelo adeus, abuso dos suspiros enquanto agonizassem mensagens telepáticas do agora. Assim se amaram paralelamente e até contrastando com o que a razão demandava: o conforto da estabilidade, da organização, do futuro saudável. Sabiam que precisavam de um amor saudável que os desse segurança e paz de um gozo sem dor. Mas para eles - entre eles - seus arrepios só faziam sentido se doessem, se autoconsumissem. E desprezavam-se enquanto aquele momento não chegasse. E quando chegava, sem conversas bobas, sem performance de conquista, apenas a entrega, o all in com cartas mortas. Um episódio bastava para criar as páginas de memória. E apaixonaram-se, não um pelo outro, e sim pelas páginas que escreveram. E, como se nunca duvidassem de que era isso que aconteceria, assassinaram o tempo. Naquela última noite antes de sua partida, o futuro foi sequestrado. Futuro abolido, só o que restaria era a morte. O romance trágico estava pronto daquelas páginas de memória. Assim que o último fogo ardeu entre suas pernas, se encontraram mortos pelados em cima da cama, cobertos de gozo venenoso.

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