segunda-feira, 3 de outubro de 2011

desconforte-se

Doces momentos em que Pedro salta para fora de sua casa. Retira-se de seu fétido lar
coberto de energia densa que o amarra em sua prisão voluntária.

Pedro dedicou-se massivamente na construção de seu espaço-depósito de isolamento
e solidão. Tem medo dos mistérios do Fora. Da imensidão do mundo. Da possiblidade dos
encontros de olhares com os desconhecidos da rua. Tem medo de perceber que é pequeno e
covarde. Por isso se tranca. Com seus cigarros e suas dores.

O medo se transforma em preguiça, ou preguiça sempre foi, nunca se soube. Não
importa. Pedro fica em casa e se esvazia. Vomita o mundo, caga as lembranças. Excreta tudo:
planos, desejos, possibilidades. A materialidade se dissolve, porem seu odor permanece. Odor
denso. Pedro vazio, atmosfera densa. O ar esmaga Pedro.

Procura desesperadamente um jeito de fazer o tempo passar mais rápido. Fuma
seus cigarros devagar até que sua garganta seque. Se masturba sem vontade, sem nenhuma
referência. Abre o jornal nos horários das sessões de cinema já sabendo que não irá. Senta no
sofá e espera um convite anônimo.

De repente, quando o ambiente de clausura já se tornava insustentável ao corpo de
Pedro, uma carta surge por debaixo de sua porta. Um convite para uma defesa de doutorado.
Sem pensar, Pedro veste seus calçados e sai.

A luz do fim do dia desconforta seus olhos, o que a Pedro lhe agradou, pois o
desconforto o distanciava de sua ausência de dor. Pedro nunca se sentira tão feliz perante
aquela sensação que o lembrava de sua existência.

Um comentário: